agosto 29, 2015

(pausa para respirar)

Estou aqui mas é como se não estivesse. Estou de férias e devia querer sair e fazer coisas mas a única coisa que quero é ficar em casa, recolher-me o máximo possível e não falar com ninguém.

Ter um bebé já com seis meses que não dorme é debilitante. Ter um bebé que não dorme de dia e também não dorme à noite é um pesadelo tornado realidade. Sinto uma espécie de terror assim que se nota que ela precisa de dormir porque sei que não vai conseguir. E se ela não consegue, eu não consigo. Os meus pais bem têm ficado com ela para me aliviar mas é difícil: há outro filho para entreter durante o dia e as noites continuam a ser apenas minhas. Ler sobre o assunto (obrigada Madalena!) não tem ajudado: faz-me sentir bem por saber que há quem passe pelo mesmo mas ainda não consegui melhorar nada. É duro, dia após dia, ver chegar as noites e saber que não vou dormir ou vou acordar de hora a hora e saber que durante o dia a situação também não vai melhorar. "Durma quando o seu bebé dormir", dizem os especialistas. E quando o bebé não dorme, fazemos o quê? Agora tenho ajuda mas daqui a duas semanas, como é suposto sobreviver sem dormir? E se, em vez de melhorar, toda a situação piorar com o passar dos meses?

Não tenho vontade de fazer nada. Forço-me a sair pelo mais velho e pouco mais. Não tenho nenhuma capacidade de concentração, não tenho paciência, não tenho assunto, nem sequer vontade de conversar. Gostava muito de dormir mas, acima de tudo, que ela encontrasse o seu descanso e um padrão de sono que não a deixe agitada. Que durma mais de uma hora de cada vez. Que todos aqui em casa possam também descansar. É evidente que não foram estas as férias com que sonhei. Começa também a tornar-se óbvio que quando regressar não vou mais descansada do que quando cheguei. Não tenho respostas às minhas perguntas, nenhumas.

Por enquanto quero apenas todo o silêncio que conseguir. E que finalmente possamos dormir.

agosto 23, 2015

Bem-te-quero, mal-te-quero


Não sei exactamente quando me chegou a vontade pela primeira vez. Não sei se houve sequer alguma razão para ela aparecer mas sei que na altura não a saberia vocalizar. Eu tinha que sair de Portalegre.

Apercebi-me esta semana, enquanto parava no miradouro por breves instantes, que tenho uma relação de amor ódio com a minha cidade. Eu tinha dezassete anos e podia ter escolhido ficar mas nunca quis - precisava ir embora. Felizmente, os meus pais (à custa sei lá de que sacrifícios) deram-me a possibilidade de escolha, que muita gente não tem. Quis ir para Coimbra durante algum tempo mas, talvez assustada com toda a (para mim exagerada) tradição académica, acabei em Lisboa com apenas dezassete anos. Lá vivi quase tantos anos como em Portalegre e, apesar de não ter lá nascido, é sempre lá que sonho voltar. A Portalegre quero apenas regressar pela família que deixámos para trás.

Também percebi que me defino mais como alentejana do que como portalegrense e de maneira nenhuma me vejo como alfacinha, embora sonhe com Lisboa todos os dias. Admiro muito as pessoas que escolheram ficar aqui e outras que, não sendo portalegrenses ou sequer alentejanas, assentaram aqui arraiais. Algumas fazem pela cidade muito mais do que eu alguma vez fiz mas  a vontade de sair, de me perder fora daqui falou sempre mais alto. Mesmo assim, continuo a achar que para vencer nesta cidade são precisos demasiados empurrões e conhecer as pessoas certas é absolutamente essencial. Acontece que nunca nos movemos nesses círculos. Não tenho pena, talvez apenas alguma mágoa por ver como toda a vida as coisas funcionaram aqui.

Hoje olho para a minha cidade, vejo as mudanças radicais desde que daqui saí, perco-me em memórias daquilo que um dia aqui vivi, penso na tranquilidade que seria ver os nossos filhos crescer aqui mas sei que nunca poderia ficar. Sentir-me-ia asfixiada, sem possibilidade de ver mais mundo com os meus olhos e de o dar também a ver aos miúdos. Este ano concretizei o sonho de pisar outro continente e sei que só o pude fazer porque um dia saí.

Espero que a minha cidade me perdoe. Voltarei enquanto os nossos estiverem vivos e, num mundo ideal, escolheria ficar aqui descansada. Mas o mundo é grande demais para este meu coração e preciso de sentir que posso ir sempre mais longe. Com ela no coração, sempre.

agosto 11, 2015

(Ainda aqui estou...)

Inaugurei ontem a terceira semana em Portugal e a primeira de malas desfeitas em Portalegre. Restam-me ainda trinta dias por aqui que vou aproveitando como os miúdos vão deixando.

A viagem de carro foi bastante dura e longa. As auto-estradas francesas fazem-se pagar bem mas não nos livramos de alguns (muitos) quilómetros de filas, especialmente a seguir a Bordéus e especialmente a meio de um enorme fogo florestal já mais perto da costa que mobilizava meios aéreos e terrestres.

A viagem também é uma interessante experiência sociológica: cruzámo-nos com gente de muitos países com comportamentos a dar razão a alguns estereótipos. Os jovens muçulmanos parados nas áreas de serviço, de tapete na mão, a prepararem a oração da tarde enquanto a sua jovem mulher esperava em silêncio no carro; os holandeses, todos altos, todos louros e todos com mais de três filhos; os magrebinos em carros com matrícula belga ou holandesa, carregados sabe-se lá do quê nas lonas mal esticadas em cima do carro e (quase todos) com uma bicicleta de criança em cima; os belgas a conduzirem invariavelmente na faixa do meio, a atrasarem a vida aos outros condutores; os franceses com as bicicletas sempre atrás, como se as férias só fizessem sentido sobre duas rodas; os portugueses, a colarem símbolos da pátria onde podem para que toda a gente saiba de onde eles vêm; os carros de matrícula luxemburguesa que eu ia festejando - num país tão pequeno, a possibilidade de conhecer as pessoas é enorme!

Depois foi Lisboa e a nossa casa em Lisboa, já muito apertadinha para os quatro. Comporta, Guincho, praia das Maçãs, Fonte da Telha; Chiado, Martim Moniz, Estrela e Campo de Ourique; peixe grelhado, frango assado e alguns caracóis; amigos, irmãos e vizinhos - mesmo sem planos, acho que conseguimos atenuar algumas saudades.

E agora Portalegre, Portalegre e Portalegre. Os miúdos a serem mimados pelos avós, a mãe a descansar sempre que pode. Os três com saudades do pai que já regressou ao trabalho mas os quatro a juntar forças para o ano que começa em Setembro.