novembro 30, 2010

(uma pausa merecida)

Vamos lá a ver: desde a última vez que aqui escrevi, o Vicente fez dois meses mas também me impediu de voltar a escrever o que quer que fosse. Comecei posts algumas vezes mas fui sempre interrompida pelo choro ou por alguma necessidade mais premente. Estes dois meses têm-me ensinado mais do que esperava mas também me têm mostrado demasiadas debilidades minhas que ainda não sei como combater. Desespero com muita facilidade, choro quando não sei o que fazer, perco muitas vezes o fio à meada e deixo de ser racional. Hoje sei que precisava de ajuda, pelo menos para respirar um pouco, retomar o fôlego e a coragem mas estar longe da minha família tem destas coisas. Às vezes precisava só de cinco minutos de ausência de responsabilidade para me poder refazer e tenho vergonha disto. Eu sei que é normal mas também vejo outras mães mais corajosas e fortes, que talvez escondam as suas dores com mestria e se concentrem nos seus bebés. É inevitável pensar que raio de mãe vim a ser.

Primeiro, sofri com a amamentação, que hoje já aprendi a dominar e a ignorar as dificuldades. Agora são as cólicas, as dores de barriga inexplicáveis, o sono que o bebé tenta a todo o custo vencer. É um cansaço diferente, o de hoje. Não são exactamente as noites mal dormidas mas são os dias que passo com o Vicente a esgotar as estratégias para o ver contente, a mudar de soluções a cada cinco minutos, a tentar não me abalar com a imprevisibilidade que é ter um bebé em casa. E depois é o Outono (ou deverei dizer Inverno?), com a chuva e o frio das massas polares que não convida a levar um bebé tão pequeno para a rua. Para minorar isto tudo, o Vicente começou a sorrir, especialmente quando falamos com ele. Sorri muito e parece que quer falar connosco, parece que já tem coisas para nos dizer e são estes momentos que vão fazendo esquecer tudo o resto. E também é um regalo vê-lo a aumentar de peso e a crescer, a mudar as feições e a ser elogiado nos corredores dos supermercados.

O que eu gostava era de me sentar e escrever os dias maravilhosos que temos passado juntos. E têm sido todos muito bons mas tantas vezes é difícil ver para além das dificuldades. Quem me dera poder esquecê-las e falar-vos daquele indescritível sorriso desdentado. Eu sei que tudo vai mudar, eu sei. Mas às vezes esqueço-me disso tudo e quero-o diferente já. Há dias assim.

novembro 26, 2010

Depois da tempestade, (algum)a bonança

Foram mais uns dias passados com um nó bem apertado na garganta que só consegui desatar hoje de manhã. Um possível sopro no coração e as fontanelas que não fecham - tinha sido este o diagnóstico na primeira consulta com a pediatra do Vicente. Não é preciso dizer que saí de lá atordoada, como se de repente descobrisse que tudo o que vivera até ali não passava de uma mentira e afinal não tivesse dado à luz um bebé saudável. Lembro-me de empurrar o carrinho do bebé no parque de estacionamento do hospital, completamente zonza e só de volta à realidade com um telefonema do pai. Nunca me ocorreu que os exames pudessem ser apenas de rotina, já que a médica não demonstrou qualquer urgência.

A verdade é que não quisemos preocupar ninguém e guardámos o «segredo» até esta semana e até sabermos que está tudo normal, regular, saudável, vivaço. Era um golpe demasiado forte para mim, se se confirmasse alguma patologia, especialmente depois de ter toda a gente a elogiar o tamanho e o peso deste meu bichinho. No meio desta história toda, ficou uma espécie de nódoa quando a médica do centro de saúde sugeriu que os pediatras daquele hospitais aconselham estes exames a todos os bebés para que os colegas possam também ganhar algum... Claro que tudo não passa duma suspeita e nós, na posição delicada em que estávamos, não pudemos arriscar a não fazer os exames mas a verdade é que a confiança nunca mais será total. O que interessa agora é que tenho o meu bebé junto de mim e, mais importante, muito saudável, apesar de todo o choro antes de adormecer e de todas a cólicas que o fazem contorcer. Uma pessoa tem filhos e depois vai-se a ver e já não ganha para os sustos!

novembro 21, 2010

«Desde que meu filho pari, nunca mais a barriga enchi»,

dizia-me a minha mãe há uns dias atrás. É evidente que não é um provérbio para ser tomado à letra mas a verdade é que, com a chegada do Vicente, muitos hábitos mudaram, especialmente para mim. É verdade que muitas vezes adiei as minhas refeições para que ele pudesse comer e outras vezes interrompi-as ou deixei-as a meio para o acalmar e dar colo. Não se trata de não comer ou passar alguma fome: felizmente, o apetite é o de uma mãe saudável que amamenta o seu filho e até agora nunca faltou nada na nossa mesa.

Mas a verdade é que outras coisas passaram para segundo plano desde que o bebé nasceu: os banhos são quase sempre tomados à pressa e sempre a espreitar do poliban; voltei a cozinhar esta semana, depois de sete semanas fora da cozinha; não consigo cumprir muitos horários e frequentemente faço coisas à pressa; poupo imenso a roupa porque preciso de andar sempre pronta para amamentar; inevitavelmente, os meus hábitos de sono estão em frangalhos mas já estou mais habituada às interrupções. Acho que consegui ler umas três páginas dum livro e parte dum suplemento de jornal desde que ele nasceu, música nova tem sido escassa e saídas à noite é o que se sabe. Mas basta-me só tê-lo a dormir ao meu lado assim que a manhã desponta para que tudo o resto se esfume. Vou dando tempo ao tempo e, quando menos esperar, recupero a minha ligação ao Mundo porque agora ele é tudo o que conta, especialmente quando sinto que ele me segue com os olhos para todo o lado.

novembro 16, 2010

Sobre hypes e saídas a dois

O pai do Vicente registou para a posteridade.

Não sou (ou não fui), como a maior parte das pessoas que estava ontem no Coliseu, seguidora ou sequer ouvinte da Caderneta de Cromos. Em parte, porque não conduzia para ir para o trabalho e também porque, com o passar do tempo, fomos perdendo o hábito de ter o rádio ligado lá no escritório. Por isso, não me revi ontem em parte da histeria que se fazia sentir na sala, repleta de senhores de pullovers às costas (a forma mais inocente mas gráfica que o pai do Vicente arranjou para descrever a maior parte do público). Nada disso, porém, me impediu de me divertir à brava ou não fosse este espectáculo da autoria dum homem a quem admiro o humor e a aparente inesgotável criatividade - Nuno Markl. Tendo ele conduzido a maior parte do espectáculo, couberam-lhe também os momentos mais deliciosos de humilhação nos sketches sobre a sua infância ou no desafio bélico ao público. O que gosto especialmente no trabalho do Markl é esta ideia de que nem todo o entretenimento tem que ser feito com base ou na brejeirice, ou com piadas escatológicas ou com a excessiva exposição das pessoas e evidentemente revi-me em muitas das lembranças dessa década já longínqua de 80. Temos a agradecer à melhor tia e madrinha do Mundo esta noite bem passada e um Fizz limão quase a chegar à meia noite.

(Saímos só os dois porque a dita madrinha do Vicente logo se dispôs a tomar conta dele. Foi a segunda vez que saímos sem o nosso filho - a primeira foi para ver o Manel Cruz a apresentar o Foge Foge Bandido em Portalegre - e enfim, saímos de casa com sentimentos altamente contraditórios. Se, por um lado, foi muito refrescante poder estar três horinhas apenas na companhia um do outro, sabendo que o nosso bebé estava entregue em boas mãos, por outro ficámos essas três horas meio impacientes, pensando nele e nos olhões abertos que nos seguiram quando fechámos a porta de casa. Sair a dois não é mais do que um bálsamo para a nossa sanidade mental, já que o tempo não tem estado para grandes passeios. Mas a verdade é que parte de mim sente culpa por deixar o bebé. Regressar e encontrá-lo muito calmo, a dormir nos braços da madrinha, aliviou essa culpa.)

novembro 12, 2010

Sobre a amamentação: crónica de um falhanço

Não foi preciso nenhum curso nem nenhuma lavagem cerebral para, logo no início da gravidez, decidir que iria amamentar em exclusivo o meu bebé. A ideia de que poderia dispensar suplementos ou outras fórmulas ditas mágicas veio depois, quando solidifiquei os meus conhecimentos e quando me mostraram que existem alguns mitos à volta do acto de amamentar. O Vicente mamou pela primeira vez na sua primeira hora de vida, como recomenda a Organização Mundial de Saúde mas logo ali eu percebi que iria ser uma longa batalha. A amamentação implica uma disponibilidade gigantesca para o bebé, implica que, de certa forma, nos esqueçamos de nós e tudo à nossa volta para nos podermos concentrar apenas nela. Estive quase a desistir por várias vezes, convencida de que não aguentava este nível de atenção e outras dificuldades fisiológicas que encontrei pelo caminho mas fui conseguindo aguentar.

Esta semana, com muita pena minha, o Vicente teve (como é natural) um pico de crescimento, o que significou que quis mamar muito mais do que habitualmente, de forma a estimular a produção de leite. O meu corpo ou fraquejou, ou demorou a acompanhar o passo e foi assim que desabei a ouvir o meu filho a chorar ininterruptamente com fome, sem dormir porque provavelmente o estômago precisava de mais conforto. Não encontrámos outro remédio que não fosse ligar à pediatra e pedir conselhos sobre suplementos, para que ele pudesse ser convenientemente alimentado. Muitos dirão que deveria ter aguentado, tentando ignorar o choro descontrolado do bebé, a bem duma aleitação materna em exclusivo. Confesso que esta pressão social em que me envolvi conscientemente - a de que só o leite materno é suficiente, estigmatizando que opta por outras soluções ou quem a elas se vê obrigado - foi a única barreira a separar-me desta opção partilhada já há muitos dias. Quis também recusar a ideia de que o meu leite não seria suficiente e acabei por não dar ouvidos a vozes mais experientes, tentando confiar no meu instinto maternal. O suplemento entrou em nossa casa ontem à noite e o Vicente acalmou e dormiu. Continua a beber leite materno porque não acredito numa alimentação completamente artificial mas em mim ficou uma espécie de mácula: a ideia que eu mesmo criei de que, incapaz de amamentar em exclusivo o meu filho, sou menos capaz e falho em proporcionar o melhor que posso ao meu bebé. Vamos vivendo com pequenas vitórias todos os dias mas também é necessário saber encaixar as derrotas. O meu corpo talvez me tenha falhado mas é importante continuar: a serenidade do meu filho enquanto dorme vale todas as latas de leite em pó do Mundo.

novembro 10, 2010

Ando completamente obcecada com algumas questões de saúde do Vicente. Parece que quanto mais leio e investigo online, mais dúvidas me surgem e mais os medos me crescem. Acho que já dei comigo a desejar que os tempos fossem outros e que não houvesse tanta informação disponível. Bem sei que devemos filtrar toda a informação que temos ao alcance mas é impossível ficar indiferente ao que lemos, especialmente se se tratarem de experiências relatadas na primeira pessoa. Eu sei que ter filhos é isto mesmo mas sempre pensei que sei lá, tudo fosse um nadinha mais fácil. Adormecer e acordar com o coração na garganta nunca, nunca foi para mim.

novembro 06, 2010

Trinta e um Outonos

Que ano, este! Ficará para sempre marcado como o ano em que chegou aos meus braços o meu pequeno homenzinho, a maior alegria que já senti desde 1979. O ano foi definitivamente de renovação: começou com uma imensa tristeza a oito de Janeiro, seguiu com uma notícia espantosa dia oito de Fevereiro, abanou-me no dia trinta e um de Julho e mudou a minha vida para sempre a vinte e nove de Setembro. Com as devidas e inevitáveis excepções e saudades, tive um ano muito, muito feliz. Este novo ano da minha vida, que hoje começa, promete ser outro de descobertas, alegrias, preocupações e muito trabalho. Estou pronta para os desafios que aí vêm mas, até lá, vou abraçando o meu pequeno, o meu outro mais que tudo e a restante família que me vai batendo à porta. Tem sido uma vida do caraças!

novembro 01, 2010

Passear a Sudoeste


As fotografias são do sujeito do costume.

Sempre achei meio deprimente passear durante o Inverno pelas estâncias balneares mais populares de Verão. Todas as portadas estão fechadas, as ruas maioritariamente vazias, as praias meio engolidas pelas marés vivas, as povoações a descansarem do reboliço dos meses quentes. Mas, ao mesmo tempo, há naquela ausência de agitação uma calma tão contagiante, um restabelecer de forças tão merecido que não há como não me sentir aconchegada, mesmo debaixo de ventos quase ciclónicos. O cinzento do céu confunde-se com o mar, as gaivotas estão inquietas em terra e há um ou dois velhotes que se atrevem a contornar a praça. As restantes pessoas dividem-se entre os turistas nacionais, encasacados e incomodados pelo vento, de máquina fotográfica na mão e os turistas internacionais, que estacionam as auto-caravanas onde podem e saem, calções sobre as pernas brancas e os habituais impermeáveis, apenas para olhar o mar.

Foi uma desilusão, o vento tão forte. Graças a ele, o bebé mal podia sair do carro: um mês de vida ainda não chega para resistir a tempestades assim. Gostava que tivesse festejado o seu primeiro mês sentindo pela primeira vez o cheiro do mar, ouvindo as ondas mesmo sem saber de onde vinha o ruído, piscando os olhinhos debaixo do sol de Outono. Não pudemos mostrar-lhe a praia mas passámos estes dias brincando com ele, apanhando novos sustos (todos os dias há surpresas!), tratando de o entender mais e melhor. Não foi nada fácil conjugarmos os nossos horários com os dele mas o dia da nossa sintonia há-de chegar. O primeiro passeio já está - para a próxima será melhor.