agosto 31, 2007

Um povo, uma cultura, uma região

Já me tinham dito que era um sítio obrigatório e que nem percebiam como é que nunca lá tinha entrado. Já tinha passado à porta tantas vezes, sem nunca me ter apercebido que era ali e, francamente, ainda bem que assim é: pode ser já muito visitado mas ainda é um segredo para alguns (os mais distraídos, como eu). O jantar do management lá do departamento (o jargão já se instalou, não há remédio) aconteceu ontem na Casa do Alentejo, depois de sugerido por um colega.

A comida era um mimo, verdadeiramente alentejana, sem decepcionar na variedade e na quantidade de banha usada para fazer aquelas migas.O vinho bebeu-se tinto, aliás, não poderia beber-se outro na sede da alentejanidade e era um vinho macio e pouco doce, ideal para não acordar com a boca seca no dia seguinte. A companhia não comprometeu, deixando os assuntos rotineiros para o sexto piso da Latino Coelho. Sete mulheres para um homem, a simbolizar a distribuição dos sexos naquele prédio todo. Depois do jantar, seguiu-se o deslumbramento daquelas salas com tecto, chão e paredes trabalhados, a influência árabe em cada pormenor, os azulejos tradicionais tão bem conservados, um orgulho quase irritante em ser alentejana. Podia aqui dissertar sobre a maneira alentejana de ser mas não vale a pena. Vocês sabem do que é que eu falo.

agosto 28, 2007

Um desafio!

Porque só agora se reuniram as condições ideais, aqui fica um desafio a todos os que espreitam este espaço. Falem-nos ( a mim e a ele) sobre as coisas que vos tiram o fôlego. Pode ser um objecto, um animal, o vosso amor, a vossa terra. Acompanhem com uma fotografia (se quiserem) e mostrem (porque não?) ao Mundo aquilo que vos faz feliz.

Basta que nos enviem o pedaço de felicidade para este mail. Pode ser uma descrição breve, um poema, uma canção, uma deixa de um filme. Surpreendam-nos! Afinal, a beleza às vezes está onde menos esperamos. Já podem ver coisas que nos fazem feliz aqui.

agosto 27, 2007

Motivos para sorrir (por ordem de aparição) *


Um leque que me chegou às mãos vindo directamente das belas ramblas de Barcelona (cortesia do M., o que só vem provar que é bom levantar-me todos os dias para trabalhar). Uma travessa de aletria que me chegou às mãos directamente vinda da porta ao lado (cortesia da minha vizinha M., que talvez me tenha querido agradecer por lhe ter perguntado pelos joelhos).

* a contrastar com o abraço de que ele hoje precisava e que eu não pude dar.

Violent mood



Ontem alguém pensou que eu tinha tido um ataque cardíaco. Assistimos a duas trovoadas secas que se deslocavam furiosamente sobre o céu, sentados na praça. Amanhã retomo o ritual de acordar antes das sete. Está calor mas já não está aquele calor. Apetece-me pegar no carro e fazer cem mil quilómetros sem parar. Today I'm on a violent mood.


(As imagens, como de costume, são minhas e Be quiet and drive (far away) é uma música dos Deftones.)

agosto 24, 2007

Das tristezas alheias

Quando saimos do cinema, decidimos que o melhor é apanhar um táxi e fazer duas paragens. Ele fica em Santos, eu peço para o taxista me levar à Estrela. Depois dele sair, vejo-me inesperadamente travada por um camião do lixo que fazia a recolha àquela hora. A conversa com o taxista nasce desta paragem, passa pelo Euromilhões, pelas dificuldades com que vivemos, por tudo aquilo que faríamos com um pouco mais de dinheiro.

Quando ele começa a falar da separação por que passou há um ano, eu não adivinho que vai terminar a conversa de lágrimas nos olhos. Conta-me como o amor o cegou, como embarcou num casamento que o deixou na miséria e que rompeu com o que restava do seu coração. Diz-me

Quando eu entro numa sala e ela está lá, o meu coração fica escuro, um poço negro sem fundo

e eu comovo-me com esta franqueza. Parados em frente à basílica, conversamos sobre o amor e as mulheres e ele olha-me com tristeza pelo espelho. Tudo o que o amor constrói também pode destruir, semeando a devastação. Diz que já não acredita no amor mas que eu devo acreditar, a menina é nova, diz ele. Despedimo-nos com um aperto de mão, ele chama-me amiga e pede-me desculpa. Já é tarde demais: para mim, porque me ataca o sono; para ele, porque já não quer saber do amor. Durante quase uma hora, fomos amigos.

agosto 21, 2007

Dormir mais feliz #7 *

woman driving, man sleeping
passing all the other cars
searching in the black
but never turning to look back
a little metal box under the stars


*tentando pensar além deste vento que me assobia em todas as janelas. Talvez seja esta loucura que nos é soprada à força que me planta estas imagens na cabeça: os dois naquele sofá, a fingir que nos tocamos apenas por acidente; as pernas longas e magras em direcção a mim debaixo daquela luz amarela; a lenta e delicada ponta dos dedos dele; o beijo que evitamos até quase perdermos o fôlego.

É um sonho recorrente este, em que ele vai no banco ao meu lado enquanto conduzo. Leva os olhos fechados mas não dorme. Reclina o banco e vira-se para mim, de maneira que vejo o brinco a luzir atrás dos caracóis que não penteou. Espreita-me, pensando que eu não o estou a ver - eu vejo-o tão bem. Olhamos um para o outro sempre pelo canto do olho, com medo que o outro perceba o fascínio. Já estamos atrasados e as filas de trânsito demoram-nos ainda mais. É mais tempo que passamos em silêncio, dizendo adeus.

Day Off

(Ainda estou indecisa se conto ou não à mamã, para evitar outra reacção daquelas.)

Hoje foi dia de folga e, não sei se alguma vez o disse, eu adoro folgas durante a semana. É óbvio que os fins de semana deviam ser sagrados mas este sossego das terças ou das quartas é tão bom quanto matar saudades num sábado. Portanto, um dia inteirinho à minha frente ditava que eram necessários planos. E os planos fizeram-se ontem à noite, entre uma colher de Fragolata e dois episódios dos Sopranos.

Actividade Um: subir a íngreme encosta até à rua Ferreira Borges, tentando escapar às velhas senhoras que desciam com os cabelos ensopados em laca; entrar no supermercado para me abastecer das mercearias mais básicas, entre elas um gelado de pêssego com molho de framboesa (das mais elementares necessidades, pois); descer a encosta, orgulhosa do meu saquinho de pano amigo do ambiente (e das minhas costas também.)

Actividade Dois: pano amarelinho, luvas rosa de borracha, creme de limpeza, água quente, aspirador - esfregar a casa de ponta a ponta, deixar as louças a brilhar, aspirar as quantidades industriais de cabelos meus que se passeiam pela casa; terminar com uma muito bem executada recolha da roupa já seca.

Actividade Três: subir para o autocarro 738; descer na praça do Duque de Saldanha; entrar no Nimas a pensar que ia ver o Diário de um Escândalo e descobrir que afinal vou ver o Labirinto do Fauno; sair de lá satisfeita, a pensar por que raio não me apetece mais vezes enfiar-me assim numa sala de cinema; fazer o caminho até ao Monumental em cinco minutos; comer um croissant de chocolate e sentar-me a ver Evan Todo Poderoso; deixar o cinema com a sensação de 'Ehhh...' [ler com tom de desconsolo].

Actividade Quatro: apanhar o 36 até à baixa e fazer o caminho até ao Chiado a pé; entrar na Fnac para comprar um livro que me tinham encomendado e sair de lá sem ele mas com outro livro e um Moleskine; pela enésima vez, pensar que nunca mais lá entro assim sem dinheiro.

Tudo solita. E o bem que soube, hã?

agosto 20, 2007

Baldes de água fria *

Estava há quatro dias sem sequer pensar em internet, blogs, stats e outras coisas do género. Foi um fim de semana preenchido e cheio de sol, a contrariar algumas previsões. E tinha coisas para escrever, talvez fotografias para partilhar. Mas passou-me a vontade toda quando meti a chave na caixa de correio e dei com uma factura do maior operador móvel de Portugal. A cobrar-me 54-euros-54 por ter usado o serviço deles durante 7 dias. Um serviço que, na maior parte das vezes, não durava mais que 5 minutos ligado. E de repente apeteceu-me mais berrar com toda a gente e resolvi ninguém merece. Vou só ali despejar a minha raiva (estou indecisa entre uma caixa de gelado e cervejas geladas) e já volto.

* também podia ser águia fria, que não sei quem se lembrou desta comédia do Camacho voltar ao Benfica em tão curto espaço de tempo. Mas eu gosto dele. Parece um ursinho, o espanholito.


agosto 14, 2007

Eu disse: é o medo que nos vem acariciar. *

Depois de o ver em Paredes de Coura, a minha convicção cresceu e fui dominada pelo seu porte altivo e semblante (que maravilha, não esperava usar tal palavra) carregado. O Adolfo Luxúria Canibal é o gajo mais bem parecido do róque português.


* de Tu disseste, dos Mão Morta

agosto 13, 2007

Puseste o dedo na ferida

Mãe: Então, o que é que fizeste hoje?
Eu: Fui ao cinema à tarde.
Mãe: Sozinha, outra vez?
Eu: Hei-de ir com quem? Era segunda-feira à tarde, ninguém está livre.
Mãe: É que andas sempre sozinha.
Eu: Não ando nada.

(Acabo a chamada com o nó na garganta que sentimos quando sabemos que não temos razão. Quero dizer-lhe que é mentira mas não consigo argumentar mais. Nem inventar mais. Por isso, às segundas-feiras à tarde ninguém larga o trabalho para ir ao cinema comigo. Nem às terças ou noutro dia qualquer da semana. Eu cá já me habituei a sentar-me sozinha e até já nem sinto falta de comentar o filme. Toda a gente aprende a estar só.)

agosto 12, 2007

Sobre coisas que fazem acelerar o coração *



Bebemos a garrafa de Monsaraz naquele jantar como quem mata a sede numa tarde de Verão. Ele servia-me ou eu mesma pegava na garrafa, enquanto toda a gente se contentava com uma sangria arrasada pelo excesso de canela. Ouvimos anunciar à mesa Eu vou ser pai, a sério, vou mesmo ser pai. Brindámos à felicidade evidente daquelas duas pessoas. Descubro mais uma grávida na mesa e dou comigo a pensar se alguma vez vou sentir aquela alegria desenfreada, se alguma vez vou tocar na minha barriga e sentir vida. Não sei se vou mas faço votos que sim. Fazer votos já não chega mas isso eu consigo controlar. Ter um filho é que é uma coisa que já me escapa mais.

Combinamos uma hora tardia num sítio improvável. Na verdade, não sei se ainda o consigo reconhecer porque há sempre demasiado tempo entre os nosso encontros. Já não vou nervosa. Bem, pelo menos até faltarem oito quilómetros, altura em que regressam as borboletas na barriga e eu fico aflita com tantos nervos. Quando o apanho numa rotunda deserta, descubro que as borboletas sossegam, ficam escondidas, abrandam o ritmo, deixam de me afligir. Passamos a noite a tentarmos não nos concentrar um no outro, a tentar ignorar esta vontade que nos queima a ponta dos dedos. A gata Mia olha para mim demasiado fixamente, como se me quisesse ver por dentro e eu não consigo afastar os meus olhos dos dela. Quando finalmente nos deitamos, sentimos os braços e as pernas em espasmos devido ao cansaço. Os meus espasmos também resultam do meu braço tocar o dele... Por muito tempo que viva, nunca vou entender isto que me liga a ele.

Ouvi muito esta música numa altura em que vivia com o coração na garganta porque pensava que tinha um pedaço de felicidade nas mãos. Uma vez, no elevador do trabalho, pensava que não ia aguentar a taquicardia com que vivia aqueles dias. Não faz mal que me tenha enganado: foi só mais uma vez. Hei-de enganar-me muitas mais e, mesmo assim, hei-de continuar a gostar das coisas simples. Como estes meninos na água ou o casal que se beija envergonhadamente. Há-de de haver sempre um sopro a acelerar-me o coração.

*Postcards from Italy dos Beirut

agosto 08, 2007

Dormir mais feliz #6


So until your your blood runs to meet the next full moon
You're madness fits in nicely with my own
Your lunacy fits neatly with my own, my very own
We're not alone *


* ou estamos?

agosto 07, 2007

SW 07: os freaks já não moram aqui

Estar dois anos sem ir a um festival de Verão teve o seu impacto este ano quando me vi sufocada com a imensa multidão de pessoas maioritariamente bem cheirosas que tentavam comprar o seu bilhete. Já tinha ido umas seis ou sete vezes mas nunca me lembro de ter visto tanta gente junta. Nem mesmo no dia em que os Oasis foram corridos à pedrada à segunda ou terceira música. E esta gente toda não é, obviamente, sinónimo de malta porreira e boa onda, que se quer apenas divertir e fazer praia e ouvir uns concertos (afinal vai-se lá para quê?).

Chegar lá à meia-noite não tem graça nenhuma. Acabámos a estacionar o carro do lado oposto do recinto, num sítio onde nunca tinha visto carros estacionados. Por sua vez, isto significa que tivemos que carregar as nossas tralhas uns valentes metros antes de podermos assentar arraiais. Andar não faz mal nenhum, eu sei; mas faz um bocadinho pior quando vamos com metade da roupa que temos e com o saco cama e o colchão e o saco cheio de enlatados. Depois de entrar no campismo, confirmou-se a minha suspeita de que haveria gente demais e gente demasiado nova por toda a parte. O generation gap começa a apertar muitíssimo e eu já não sei se são eles que são muitos novos para festivais ou se eu sou demasiado velha para estas aventuras... Eu juro que vi miúdos que não tinham quinze anos. Ou isso ou estão muito bem conservados.

Depois também é importante a malta com quem se vai. Eu, desprovida dos fiéis companheiros de SW (Zina, a falta que tu fizeste ali...), avancei com nova companhia. As pessoas eram divertidas e acessíveis (tendo em conta que conheci a maior parte apenas lá) mas não estávamos no mesmo comprimento de onda. Por isso, foi bom aproveitar os dias de calor na praia, estendida a dourar uma pele já de si morena mas faltou-me mais actividade e mais entusiasmo. Os concertos que vi sofreram do mesmo mal e perdi algumas das coisas que queria mesmo ver.

Mas o pior estava para vir na noite de Sábado. Um daqueles meninos extremamente bem educados, provavelmente habitante da Lapa ou Campo de Ourique, resolveu usar a traseira da minha tenda como casa de banho e o resultado foi fascinante: toda a gente a pisar-me a tenda para se desviar da bela obra de arte e eu dentro da tenda, com um valente ataque de pânico, a tentar evitar ser esmagada, com o coração a querer galgar-me as goelas. Não admira que me quisesse ver dali para fora o mais rápido possível e que, ao deitar-me no chão da minha casa, me sentisse finalmente protegida.

Já não há freaks no SW. Já não há malta que não se importa de tomar banho ou de cheirar um bocadinho a eau du suvac. Já não há malabarismos, os jambés são demasiado tímidos e desajeitados, a roupa é comprada em exclusivo para aqueles dias. O que há é uma profusão de anúncios por todo o lado, promoções a tudo e mais alguma coisa, restaurantes self-service dentro do campismo (!), pessoas que cheiram a perfume caríssimo. Há quem diga que estou apenas velha. Mas eu, francamente, acho que não e decidi só que SW (talvez) nunca mais. Para o ano encontramo-nos mais a Norte.

agosto 06, 2007

SW 07: as (parcas) imagens


Tomar banho debaixo de uma torneira que está a cerca de um metro do chão é sempre bom. Dá para dançar o limbo mas encostadas à parede e fingir que se participa naqueles clips eróticos com moças cheias de espuma. Ahem.
Ficar cliente habitual do café nestes dias também é simpático. Assim, podíamos todos os dias ouvir a dona a reclamar de ter tantos clientes, fazer apostas sobre quem arrisca a primeira cerveja logo de manhã ou comer a mesma bifana cheia de nervo todos os dias. Sweet.
Dá para amaldiçoar o dia em que decidi não levar o Ipod? Esta malta da pesada fazia-me isto na praia: tudo deitadinho, a fazer a soneca que não tinham feito à noite. E eu ali, sem conseguir dormir, pestana aberta mas não o suficiente para ler. Quero ser daquelas pessoas que dormem em qualquer lado, em qualquer posição!

agosto 02, 2007

Memórias *

Do you remember the festival
We took those drugs I never thought
I'd get into that pumpin' stuff
A thousand eyes won't recognize us

'Cause I know you and you know me
that's all you need and all I think of
I know this ain't nothing very deep but it's good fun
So don't run into the crowd


(lembro-me de uma manhã de sábado passada dentro da tenda enquanto a lama se acumulava lá fora. das quinhentas latas de atum, cavala, grão, sardinha em tomate picante, feijão frade, feijão branco, raviolis que já comi. das manhãs em que me sentava sozinha, à frente da tenda, porque não aguentava o calor. das pessoas que vi e, estupidamente, deixei passar, sem sequer dizer olá. de todas as noites que passámos sentados no escuro, a rir incontrolável e inexplicavelmente de tudo. de toda a música de dança que não dancei porque não sei ir sem companhia. de todas as praias onde destilámos a noite anterior, onde tomámos sempre banho porque praia sem banho não é praia. de o ver sentado no muro da zambujeira e deixar-me ficar sentada na esplanada, convencida de que ele também sabia que eu estava ali e isso chegava. de entrar em casa suja e encardida e não me deixarem sequer pousar as malas: banho!. não vos levo mas é como se levasse. agora com licença. vou ver como me corre a vida a sudoeste.)


* roubado a Memories of a Festival dos dEUS.