março 25, 2006

amor combate* eu quero estar lá quando tu tiveres de olhar para trás. sempre quero ouvir aquilo que guardaste para dizer no fim. eu não te posso dar aquilo que nunca tive de ti,mas não te vou negar a visita às ruínas que deixaste em mim.se o nosso amor é um combate então que ganhe a melhor parte. o chão que pisas sou eu. o nosso amor morreu quem o matou fui eu.


(Amor Combate, Linda Martini - mais alguém que escreveu uma parte de mim)

março 22, 2006

'E o livro é sobre o quê?'


Entrei na sala de descanso, estranhamente vazia. Faltava ainda algum tempo para começar a trabalhar e, para falar a verdade, a vontade era mesmo muito pouca: tinha saído do cinema, corrido sob chuva para não chegar atrasada e, afinal, tinha chegao bem antes da hora. Tirei o livro da mala e encostei-me à parede - a falta de cadeiras assim obrigava. Naquela sala não se ouve o burburinho em que normalmente trabalhamos, o que criava as condições ideais para ler. Ela entrou, cumprimentou-me, olhou o livro, comentou pela enésima vez como era giro eu conseguir ler em inglês e desferiu a malfadada pergunta:


E o livro é sobre o quê?


Pára tudo!


Não é tão desconfortável quando alguém pergunta uma coisa parecida e nós não sabemos como responder? Nunca vos aconteceu quererem explicar um filme, um tipo de música e simplesmente não haver como? Ela encostou-me à parede: se respondesse que não sabia, ela tomava-me por parva; se tentasse explicar, ela ia olhar-me de soslaio. Lembro-me quando me pediram para explicar o Donnie Darko e eu fiquei engasgada, sem saber como começar... E portanto, fiz a única coisa que sei fazer nestas ocasiões, que é mascarar o meu modesto intelecto: Ah, eu sei lá... Estes escritores hoje não sabem muito bem o que escrevem. Leio por ler, sei lá... E lá fiquei desconsolada por ter que fazer-me de parva mais uma vez e o pior é que sei que não vai ser a última.

março 12, 2006

Ufa.

Depois de procurar moradas exaustivamente, seleccionar as que me interessavam, imprimir 30 currículos para enviar pelo correio, não é mal pensado sentar-me frente à televisão: o prémio de consolação é George Clooney, esse grande querido liberal e activista, mesmo que enfiado num fato espacial manhoso.

março 11, 2006

“I had a secret meeting in the basement of my brain”, The National

Talvez tenha sido assim que me senti quando saí do cinema depois de ver El cielo gira, documentário de Mercedes Alvarez. Bem sei que não tenho nem perto de 60 anos e que não nasci numa aldeia no meio do nada (para falar a verdade, nasci numa cidade no meio do nada, essa é a única diferença.). Mas a inevitabilidade do esquecimento, que rodeava aquelas 14 pessoas sem que elas se sentissem derrotadas, foi uma das coisas mais desarmantes que vi nos últimos tempos.
Quanto mais o filme avançava, mais revia a minha visão nos olhos da realizadora: aquela aldeia está condenada mas um dia sentiu-se por ali a esperança da prosperidade, a força para fazer um futuro. A aldeia do passado era a minha infância: aquele tempo em que achava que as coisas só podiam melhorar, não existia qualquer outra hipótese. Era aquele o mundo que importava, era o único que conhecíamos. E depois começámos a subir a encosta (belíssima metáfora no final do filme) e de repente percebemos que, a partir de agora, é subir até mais não podermos, sem sequer olhar para o que deixámos para trás - o que interessa (o quê?) estará sempre no estreito mais inclinado da encosta.
As palavras daquela gente chegaram até mim na boca do meu avô. Eu olhava para o ecran e era ele que eu via. Porque ele já não fala mas quando falava era assim: sem pressa, com a sabedoria de quem passa os dias embrenhado no trabalho mas sabendo que Ela um dia há-de vir. Agora o meu avô pensa n´Ela todos os dias, espera por ela porque não lhe resta mais nada. Não consegue atender um telefone, não consegue cumprimentar um amigo e voltou a ter a vergonha de quem tem 10 anos e fez uma asneira. É preciso ter coragem para aceitar a vida como aquela gente o faz: com gratidão, com calma e com a certeza que se viveu tudo o que havia para viver. Não sei se alguma vez chegarei a ser uma velha assim.


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